A exigência de que
Santa Catarina, Paraná e a União reconheçam os crimes cometidos na Guerra do
Contestado (1912-1916), a luta pelo “bem-viver” e pela ampliação da
participação popular nos poderes estatais, são três compromissos expressados na
Carta da 5a Semana Social Brasileira de Santa Catarina (SSB/SC). O documento
foi divulgado no final do evento, em 08 de setembro, na localidade de Taquaruçu,
no interior de Fraiburgo.
Também foram
definidas 45 bandeiras de lutas, propostas por 14 grupos temáticos, que
discutiram assuntos específicos, como comunicação, gênero, religião e questão
indígena. Algumas das propostas são: unificar as agendas a fim de fortalecer as
lutas dos movimentos sociais, incentivo à produção de produtos orgânicos e
agroecológicos, fortalecer a luta contra a redução da maioridade penal,
defender ocupações urbanas organizadas na luta por moradia urbana, criar uma
rede de comunicação popular.
Reflexões
Os três assessores
destacaram pontos que consideraram estratégicos em relação às bandeiras de luta
e dos compromissos assumidos.
O juiz aposentado do
Tribunal de Justiça do Maranhão, Luís Jorge Silva Moreno observou a necessidade
dos movimentos e pastorais atuarem “com perícia” nas questões de Estado.
— Não dá para a gente
ficar lutando por uma coisa que a gente desconhece — alertou.
Moreno sugeriu a
criação de metodologia que dê sequência para a 5a SSB/SC e que resulte em
julgamento no tribunal para responsabilizar o Estado por crimes cometidos
contra o povo.
O professor de
história, da Universidade Federal de Santa Catarina, Paulo Pinheiro Machado,
analisou que as discussões da Semana Social são a atualização das demandas da
“luta e da esperança do povo do Contestado”. Eles lutavam pela instalação da
“monarquia celeste: um regime que defendia a liberdade, a natureza, a
solidariedade e a justiça. São princípios, pelos quais, nós continuamos, hoje,
lutando com outros nomes e com outras palavras”, acrescentou.
Como um caminho para
bem-viver, padre alemão Paulo Suess, do Conselho Indigenista Missionário,
apontou como um horizonte de luta o que conquistaram os indígenas da província
de Chiapas, no México. “Lá tem um letreiro, quem sabe um dia vai estar escrito
aqui também: Aqui o povo manda, e o governo obedece”, citou.
Celebração
A celebração de
enceramento relembrou a primeira romaria da terra catarinense e o massacre da
primeira “Cidade Santa” do Contestado. Os participantes caminharam até o local
em que aconteceram os dois eventos, levando uma cruz de cedro.
A romaria, reuniu a
inesperada multidão 25 mil pessoas, em 1986, e exigiu uma mobilização de água e
comida jamais vista na comunidade.
— Daquele dia em
diante, nós não somos mais os mesmos. Entendemos que para garantir nossos
direitos precisamos nos unir, se organizar e lutar — relatou Edison de Lorenzi,
líder comunitário e dono da propriedade em que foi plantada a primeira Cruz de
Cedro, cujo broto cresceu por vários anos.
A jovem Roberta
Francisca, “Chica Pelega”, líder guerreira dos caboclos e cuidadora dos
doentes, foi representada para lembrar a luta pela vida, ainda não terminada.
Ela morreu queimada com as crianças, ao tentar refugiar-se dentro da Igreja,
durante o bombardeiro feito pelas tropas do governo federal, em 1914. O ataque
dizimou a população estimada em três mil pessoas.
A celebração
continuou ao lado da capela da comunidade, em terreno doado pelos caboclos
sobreviventes da guerra. Na homilia, o bispo de Caçador, dom Severino Clasen,
pediu que as organizações saiam de “seus pacotinhos” e se unam pela justiça
social.
— Voltem com mais
coragem, mais comprometidos, mais sensibilizados, de que vale à pena,
revestidos dos sentimentos de Jesus, ser discípulos Dele para transformar. Essa
transformação já podemos ver nesse mundo, em nossos lugares, aqui e ali, os
sinais do Reino de Deus acontecendo. É possível, se nós erguermos a cabeça e
dermos continuidade a toda reflexão construída nestes dias — concluiu dom
Clasen.
Uma nova cruz de
cedro, foi plantada ao lado do museu mantido pela comunidade. A cruz
permanecerá como uma memória “da resistência na luta para uma nova sociedade”,
como destacou a equipe da celebração.
Novamente, como em
1986, a partilha de alimentos resultou em excedente, que foi doado a um
acampamento indígena, em Fraiburgo e outro do MST, em Lebon Régis.
A etapa catarinense
da 5ª Semana Social Brasileira, discutiu o tema “Estado para que e para quem?”
entre os dias 06 e 08 de setembro, em Taquaruçu, no interior de Fraiburgo, com
cerca de 500 representantes movimentos sociais, pastorais, organismos da
Igreja, além de alunos e professores de universidades federais.
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