Além de
nos fazer gastar os tubos com estádios e de obter diversos privilégios, a Fifa
deu mais um chute no nosso traseiro ao vetar o nome do Garrincha. Nas copas das
Confederações e do Mundo, o nome de um dos maiores jogadores da história não
poderá ser citado nas referências oficiais ao palco brasiliense das
competições. O Estádio Nacional Mané Garrincha perderá, nas duas ocasiões, seu
ilustre sobrenome.
A
história tem óbvias razões comerciais. A Fifa não quer saber de nada que fuja
do seu controle ou do seu caixa. É tão insaciável que, mesmo diante da
perspectiva de uma nova goleada de lucros, não abre mão de imitar as torcidas e
de gritar “mais um, mais um” — no caso, mais um milhão.
Pior é
que, no fundo, as razões da Fifa fazem sentido. Garrincha, com suas pernas
tortas, com sua imprevisibilidade, com sua alegria de jogar, representa o
avesso da lógica que move o futebol contemporâneo. O jeito Fifa pressupõe um
futebol empresarial, de plateias insossas, jogado em estádios assépticos, que
cobram ingressos caros e mostram cartão vermelho ao torcedor mais pobre. Um
futebol que pouco se constrange com escândalos que envolvem entidades e
cartolas.
Mais
grave que a arrogância da Fifa é a subserviência de nossos governantes e
dirigentes esportivos. Fiel ao seu nome, o governador do Distrito Federal,
Agnelo (cordeiro em italiano) Queiroz, preparou projeto que autoriza a adoção,
no estádio, da denominação escolhida pela Fifa. O exemplo não veio só dele: na
construção e reforma dos estádios, recomendações da entidade foram traduzidas
como se fossem ordens. Tanta passividade estimulou absurdos como a omissão de
Garrincha.
Há poucos
anos, encontrei uma autoridade envolvida com a organização da Copa brasileira.
Ela revelou que, nos preparativos da competição de 2006, a Fifa implicara com a
pista de atletismo do Estádio Olímpico de Berlim, que distanciava o público do
campo de futebol. O problema é que tal pista é histórica: foi nela que, em
1936, o negro americano Jesse Owens deu um vareio em Hitler e em suas teses de
superioridade ariana. Os alemães bateram o pé, mandaram a Fifa catar salsicha
no bar da esquina, mantiveram a pista e promoveram a final da Copa no estádio.
“Não sei como eles conseguiram isso”, comentou a tal autoridade. “Deve ser
porque eles falaram grosso e em alemão”, respondi. A Fifa sabe quais traseiros
pode chutar.
Por Fernando Molica: jornalista e escritor, no
jornal “O Dia“
Tomado do
Portal Desacato