Hoje marca o dia
do encantamento de Dom José Gomes, em 2002. Naquele triste dia escrevi esse
texto, de saudade e de amor. Dom José é uma pessoa que está sempre no meu
coração. A benção, meu lindo...
E eis então que
ele se foi. Feito um passarinho. Na
simplicidade, como sempre viveu. Encantou agora. Fico pensando em quantas
revoluções não vai provocar lá no céu. Dom José Gomes. José. Um ser único, que
tudo o que queria era ver seu povo bem. Um homem sem igual, que entregou seu
coração a essa missão nobre que foi a de levar a ideia de Jesus por onde quer
que fosse.
Estava velhinho,
81 anos, e sofria de um mal em que a pessoa vai perdendo a memória. Parecia uma
grande ironia isso. Como pode perder a memória aquele que é a memória viva da
história do movimento popular em Santa Catarina? Quando soube, me revoltei com Deus, com a
vida, com tudo. Mas, aí, certa noite, em
conversa com as estrelas, tive a resposta. Ele esquecia para que nós
lembrássemos.
O bispo de
Chapecó, iluminador de almas, nunca foi de grandes pompas. Era homem de
capelinhas improvisadas, de barracos de lona, de casas velhas de madeira, de
tendas indígenas, de chão. Foi assim que incendiou o oeste de Santa Catarina.
Esteve a frente de todas as lutas envolvendo sem-terra, atingidos das
barragens, índios, mulheres camponesas, agricultores. Um profeta. Sabia que
viria o dia da libertação, mas não ficou esperando por ele. Arregaçou as mangas
e foi construí-lo.
Nunca vou esquecer
de uma manhã, em Florianópolis, numa Romaria da Terra, em que constrangidos,
alguns padres o convidavam para ir até a Cúria, compartilhar um almoço com a
cúpula da Igreja. E ele, com aqueles olhos imensos, de pura doçura, disse não.
“Fico aqui, com meu povo”. Depois, enquanto as autoridades iam para o banquete,
ele parou em uma carrocinha de cachorro-quente, comprou um e o comeu, devagar.
Em seguida , passou a circular por entre as gentes que almoçavam na grama,
dividindo o que haviam trazido. Ele mordiscava um pão, tomava uma água, passava
a mão na cabeça de um menino. Caminhante em meio aos seus. Um homem único.
Dom José nunca fez
questão de homenagens, de bustos em praça. Só queria que as pessoas lutassem.
Essa era sua missão. Queria que sua gente fizesse caminho na dignidade, na
partilha, no amor. Foi o que plantou a vida toda. Agora foi embora, deixou a
terra, encantou. Nunca mais veremos aquela figura, de óculos imensos e olhos de
lâmpada, dizer suas palavras de amor. Agora ele só vai viver em nós, na nossa força,
na nossa luta. Vai ser difícil.
Quando ouvi a
notícia de que ele havia encantado, o chão se abriu. A primeira coisa que
pensei é de que não era justo. Não era hora ainda. Esse homem lindo precisava
ver o Brasil dar sua grande virada. Ele precisava ver. Ele é parte disso,
construiu isso. Foi fermento, foi causa. Mas, enfim, resta seguir, amparada no
seu exemplo de simplicidade e de amor. Não vamos desapontá-lo. Vamos lembrar
sempre. Lá em cima, ele se debruçará, sorrindo, e ficará feliz que a gente siga
fazendo essas “coisinhas”, que é como ele qualificava a sua luta. Indelével,
sua marca fica no coração de cada um que partilhou da sua luz. Morto que nunca
morre. Dom José. José. Presente!!!!!
Tomado do blog
Palavras Insurgentes
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