Página Correio Esportes

sexta-feira, 16 de abril de 2021

Seleção de basquete pagou o funeral de Ruth

Imagens de divulgação

A história que eu vou contar agora não é só de uma campeã do mundo de basquete, que disputou também os Jogos Pan-Americanos de Havana e a Olimpíada de Barcelona. A personagem é a mesma, é uma só, mas vamos falar aqui sobre o modo como os ídolos são tratados pelas autoridades de suas cidades, seus bairros, sua pátria, enfim.

Estou falando de Ruth Roberta de Souza.

“Sabe quem pagou o funeral da Ruth?”

Eu não sabia a resposta.

E vocês, que estão lendo essa reportagem, sabem quem pagou o funeral da pivô Ruth, campeã mundial em 1994 na Austrália, ao lado de Alessandra, Hortência, Paula, Janete, Roseli?

Quem me fez a pergunta estava triste com o descaso que cerca a vida dos ídolos do esporte nacional, especialmente se forem de origem humilde.

“A Ruth iria ser enterrada numa vala qualquer lá em Três Lagoas!”

E a Ruth, para quem não sabe, era uma esportista exemplar. Foi descoberta em sua cidade natal pelo irmão da pessoa que me deu a entrevista. A menina simples de 15 anos, filha de gari, foi vista no meio da molecada e chamou a atenção de Cardoso, professor de Educação Física, que estava na cidade sul-mato-grossense participando de uma competição, orientando na época uma equipe de Andradina.

“Na hora em que meu irmão me contou sobre a menina forte, alta e com estilo de pivô, falei com a prefeitura de Piracicaba, com a direção da Unimep, arrumamos uma Kombi, e a Catarina, que era das equipes de base, foi para Três Lagoas buscar a menina pobre, que tinha jeito para o basquete.”

E Ruth foi morar na casa das atletas de basquete. Quem tomava conta do alojamento era a mãe da jogadora Helen. Ruth chegou, treinou muito e encantou, dando início à sua carreira sob o comando de Heleninha, outro nome histórico do basquete brasileiro.

“Todos a adoravam. Ela era feliz. Era divertida. Era pura, tinha um coração de ouro. Quando ganhou seu primeiro salário, levou panelas de pressão, liquidificador e tudo quanto é presente para a sua família. Não era ambiciosa, não ligava para dinheiro. Muitas vezes, quando acabava o treino do nosso time em Piracicaba e ela via a criançada de rua pelo caminho, chamava todos para acompanhá-la. Então, comprava pizzas e servia a todos em sua casa mesmo. Era uma pessoa especial. Era um doce.”

E pela infância de dificuldades, Ruth tinha tudo para dar errado.

“Mas foi um belo ser humano. Uma jogadora valiosa! Divertia todo grupo. Não era muito de falar, mas quando falava todos a escutavam.”

Depois de saber do falecimento de sua ex-jogadora, Maria Helena Cardoso se sentiu golpeada.

“Perdi uma filha. Uma filha que o basquete me deu, que eu criei no basquete.”

Então, Maria Helena Cardoso, um dos maiores nomes do basquete feminino do Brasil (tanto dentro da quadra como trabalhando como técnica) me confessou que sentiu dois sentimentos opostos ao saber da morte de Ruth e das condições em que seria enterrada.

Imagem de divulgação

“Primeiro fiquei triste, deprimida, porque fiquei sabendo que a Ruth seria enterrada em Três Lagoas numa vala comum. Não havia dinheiro em sua família modesta para pagar o funeral.”

Porém, o sentimento de tristeza logo deu lugar a um de orgulho.

“Foi então que o grupo de jogadoras de várias épocas da Seleção se juntou em uma vaquinha e compramos um jazigo para a Ruth, que poderá ser usado até por sua família. Mandamos flores. E apesar de o país não ter mesmo memória esportiva, nós nos sentimos fortalecidas. E eu tenho certeza de que aquela geração que foi campeã mundial só encantou o mundo porque, além de ser um grupo talentoso, era um grupo de pessoas, de seres humanos. Pudemos por isso proporcionar à Ruth um enterro digno. Os vencedores só vencem pela união. E o basquete feminino tem isso. Todo mundo chorou junto a morte de Ruth. A turma da Seleção deu a ela o que ela merecia.”

Maria Helena Cardoso se emociona ao citar uma reportagem em que viu Ruth dando palestras motivacionais em sua cidade, contando como saiu da pobreza para chegar ao topo do mundo dos esportes.

“Foi bonito ver na palestra a maneira como ela contava para as crianças a evolução da sua vida: de onde saiu e onde chegou com o esporte. Ela foi um ser humano feliz. E nós vamos orar por ela eternamente.”

Por: Roberto Salim – publicado originalmente no site Ultrajano. 

Publicidade/BED
Essa iniciativa tem apoio do BED

Blog Esportes em Debates, há 10 anos, fazendo Comunicação e Esporte em Coletivo!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.